Introdução
Viajar de avião com animais de estimação, sejam eles cães, gatos ou animais de suporte emocional, é uma realidade cada vez mais frequente no Brasil e no mundo. No entanto, muitos passageiros desconhecem as regras específicas que regem o transporte aéreo de pets, o que pode gerar contratempos, multas ou até o impedimento de embarque.
Este artigo visa esclarecer, de maneira abrangente, os requisitos legais e operacionais para o transporte de animais em voos comerciais, com base nas principais normativas vigentes, como a Resolução nº 400/2016 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) e regulamentos internos das companhias aéreas.
1. Fundamentação Legal
O transporte de animais domésticos no Brasil é regulamentado por diversas fontes normativas e internas:
- Resolução ANAC nº 400/2016: disciplina direitos e deveres dos passageiros, incluindo condições especiais de transporte.
- Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986): estabelece princípios gerais sobre transporte aéreo de passageiros e cargas.
- Instruções Normativas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA): regem a documentação sanitária para trânsito de animais.
- Normativas específicas das companhias aéreas (LATAM, GOL, Azul, entre outras).
Cada companhia pode estabelecer regras adicionais, desde que não contrariem os direitos básicos previstos em lei e regulação.
Importante: Animais silvestres ou exóticos têm regras adicionais de autorização pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), conforme a Instrução Normativa IBAMA nº 18/2011.
2. Tipos de Transporte de Animais em Avião
O transporte de animais pode ocorrer de três formas principais:
a) Na cabine de passageiros
Permitido para animais de pequeno porte que, somados ao peso da caixa de transporte (kennel), não ultrapassem o limite definido pela companhia aérea (em geral, até 10 kg).
Requisitos comuns:
- Animal acondicionado em caixa adequada e ventilada.
- Caixa posicionada sob o assento à frente do passageiro.
- Animal calmo e sem odores fortes.
Pros: proximidade do tutor; menor risco emocional para o animal.
Contras: espaço limitado; nem todas as raças ou animais são permitidos.
b) No porão da aeronave
Necessário para animais maiores ou quando a companhia não autoriza o embarque na cabine.
Características:
- Transporte em área pressurizada e climatizada do porão.
- Caixa rígida, resistente a impactos.
- Animal deve estar habituado à caixa.
Pros: transporte de animais grandes; cumprimento de normas internacionais.
Contras: estresse elevado para o pet; riscos de logística em conexões.
c) Como carga viva (frete)
Usado para animais de grande porte, espécies exóticas ou para voos internacionais com exigências específicas.
Pros: transporte profissional especializado; seguro de carga disponível.
Contras: custos elevados; maior burocracia documental.
3. Documentação Necessária
O passageiro deve portar toda a documentação obrigatória para o embarque do animal, sob pena de recusa ao transporte:
a) Atestado de Saúde Animal
Emitido por médico veterinário registrado no CRMV (Conselho Regional de Medicina Veterinária), geralmente com validade de 10 dias.
Deve constar:
- Nome e espécie do animal.
- Condições de saúde.
- Aptidão para viagens.
b) Carteira de Vacinação Atualizada
Especialmente com comprovação de vacina antirrábica, aplicada há mais de 30 dias e menos de 1 ano da data do embarque.
c) Certificado Veterinário Internacional (CVI)
Exigido para voos internacionais, expedido por autoridades sanitárias do MAPA.
Para viagens ao Mercosul: pode ser usado o Passaporte para Trânsito de Cães e Gatos, emitido pelo MAPA.
4. Regras Específicas para Animais de Suporte Emocional e Cães-Guia
Animais de suporte emocional (ESA — Emotional Support Animals) e cães-guia têm tratamento diferenciado:
- Cães-guia: transporte gratuito, sem necessidade de caixa de transporte. Regido pela Lei nº 11.126/2005.
- Animais de suporte emocional: aceitos sob apresentação de laudo médico comprovando a necessidade terapêutica. Companhias podem exigir antecedência maior para notificação (algumas exigem 48 a 72 horas).
Obs: Algumas companhias internacionais e brasileiras deixaram de aceitar “animais de suporte emocional” como categoria distinta, tratando-os apenas como pets comuns, em razão de abusos e fraudes documentais.
5. Procedimentos Antecipados e Recomendações Práticas
É altamente recomendado:
- Reservar com antecedência: companhias limitam o número de animais por voo (geralmente de 2 a 4 animais).
- Confirmar todas as exigências: cada empresa possui sua própria política.
- Habituar o pet à caixa de transporte dias antes da viagem.
- Alimentação: evitar alimentar o animal até 4 horas antes do embarque para evitar náuseas.
- Check-in presencial: obrigatório na maioria dos casos, com antecedência mínima de 2 a 3 horas.
6. Limitações e Responsabilidades da Companhia Aérea
As companhias aéreas têm a obrigação de:
- Garantir a segurança e o conforto do animal conforme normas da ANAC.
- Indenizar danos em caso de morte ou extravio do animal (art. 734 do Código Civil combinado com o Código Brasileiro de Aeronáutica).
Entretanto, também podem:
- Recusar o transporte se as condições não forem adequadas.
- Exigir pagamento de tarifas adicionais para transporte de pets.
7. Problemas Comuns e Direitos do Passageiro
Se houver negativa de embarque injustificada, extravio, morte ou maus-tratos ao animal, o passageiro poderá:
- Registrar reclamação na própria companhia aérea.
- Acionar a ANAC (pela plataforma consumidor.gov.br ou SAC).
- Propor ação judicial com pedido de danos morais e materiais.
O Judiciário brasileiro é sensível à temática, reconhecendo a dor da perda animal como ensejadora de danos morais (ex.: TJSP, Apelação Cível nº 1010032-36.2020.8.26.0003).
Conclusão
Viajar com pets exige planejamento, atenção às normas e bom senso. A falta de informação ainda é uma das principais causas de transtornos para tutores e animais. Conhecendo seus direitos e deveres, o passageiro garante uma viagem segura e tranquila para todos os envolvidos.
Cabe às companhias aéreas cumprirem seus deveres de transparência e responsabilidade, sob pena de sanções administrativas e judiciais.
Em um mundo em que os animais são cada vez mais membros da família, o respeito aos seus direitos no transporte aéreo se torna uma extensão natural da dignidade humana.
Referências
- Agência Nacional de Aviação Civil. Resolução nº 400, de 13 de dezembro de 2016.
- Código Brasileiro de Aeronáutica. Lei nº 7.565/1986.
- Lei nº 11.126/2005 (Acesso de cão-guia em locais públicos e privados).
- Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Instruções Normativas.
- IBAMA. Instrução Normativa nº 18/2011.
Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível nº 1010032-36.2020.8.26.0003.